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O Brownie de O'Ferne Den 

****Ah, se vocês não sabem o que é um brownie, vamos esclarecer antes de contarmos essa história. Ele é uma espécie de "fada", ou "elfo", de aparência pequena e desgrenhada. Um brownie é o responsável por fazer as tarefas domésticas para nós, seres humanos, e, para agradecê-lo, devemos deixar uma tigela de leite ou pão em algum lugar em que ele possa encontrar. Se dermos qualquer outra coisa, como peças de roupa por exemplo, ele pode ser ofender e nunca mais voltar! Agora que sabemos o que é um brownie, vamos ao conto. 

Existem muitos brownies conhecidos na Escócia e muitas histórias foram escritas sobre eles, mas nenhuma delas é tão bonita como aquela que vou contar para vocês agora. Essa é a história do Brownie de o'Ferne-Den.

Ferne-Den é o nome de uma fazenda, famosa por possuir, dentro de suas terras, um grande morro verde e cheio de grama. Nesse morro, acreditava-se, vivia um brownie que nunca aparecia para ninguém durante o dia. Entretanto, durante a noite, ele já tinha sido visto por algumas pessoas, vagando como uma sombra por entre as árvores. É necessário dizer que nunca, nunca mesmo, ele havia machucado ninguém.

 

Como todos os brownies, ele estava sempre disposto a ajudar a quem precisasse. O próprio fazendeiro sempre dizia que não sabia o que faria sem ele. Pois se um trabalho devesse ser realizado em um curto período de tempo, tudo que o fazendeiro e sua esposa precisariam fazer era deixar a porta aberta e uma tigela de leite para o brownie, que quando eles acordassem todo o trabalho havia sido realizado e, ainda melhor que se tivesse sido feito por eles mesmos.    

 

Mas também como todos os brownies, ele era temido por sua aparência. Porque era realmente muito estranho aos olhos humanos, com seu corpo pequeno, curvado e coberto de pelos, longos braços que tocavam o chão, olhos vermelhos e pés grandes e achatados.  

 

Assim, por mais que a pobre criatura mostrasse o quão boa e gentil era, todos que viviam perto da fazenda e que, de alguma forma precisassem passar por ela, preferiam fazer um enorme contorno nas terras do que se aproximar do morro em que o brownie vivia. Tudo porque tinham medo de vê-lo.

 

Eu disse que todos tinham medo dele, mas isso não é verdade. Pois a esposa do fazendeiro, que era uma mas melhores e mais bondosas pessoas de toda a região, não temia o brownie. Sempre que sabia que ele viria à sua casa para realizar algum trabalho, a mulher deixava seu melhor leite na tigela e adicionava uma generosa colherada de creme para torná-lo ainda mais saboroso. Ela sempre dizia ao marido: "Ora, ele trabalha tão duro para nós e nunca pede nada em troca. O mínimo que podemos fazer é dar a melhor refeição que pudermos".

 

Uma noite, no entanto, a gentil mulher ficou doente e todos pensavam que ela iria morrer. Seu marido procurou durante todo o dia pelo melhor médico da região, mas nenhum foi capaz de resolver o problema. Já tarde da noite, ele descobriu que a única pessoa que existia para ajudar a sua esposa era uma anciã que vivia muito, muito longe.

 

Mas quem iria até ela a essa hora?  Estava escuro e ele não poderia sair do lado de sua esposa. Os criados não tinham coragem de ir, porque o caminho para a casa da anciã devia, obrigatoriamente,  passar pelo morro em que o brownie vivia. E, é claro, eles tinham medo de encontrá-lo.     

Quando o brownie ouviu o que estava acontecendo na casa, pois havia se aproximado para ver se os fazendeiros precisavam de sua ajuda, ele sentiu-se muito triste e, ao mesmo tempo, muito bravo, porque não acreditava que aquelas pessoas podiam ser tão cheias de preconceito, tão estúpidas a ponto de deixar a pobre mulher morrer.

 

"Bando de tolos", ele murmurou para si mesmo. Eu mesmo terei que resolver isso.

Assim, foi até o estábulo, pegou a capa do fazendeiro, cobriu seu pequeno corpo, preparou o cavalo, montou e cavalgou o mais rápido que pode. Mais rápido que qualquer homem ou mulher seriam capazes de cavalgar. E em um curto espaço de tempo chegou à casa da velha anciã.

 

Como era muito, muito tarde mesmo, ele bateu forte à sua porta para despertá-la.

"Quem está aí?", perguntou a mulher?

"Você deve vir comigo", respondeu o brownie, "pois a senhora da fazenda Ferne-Den está muito doente e só você poderá salvá-la".

"Eles me mandaram alguma carroça para o transporte?", questionou a anciã, já aprontando-se para sair.

"Não, minha senhora. Eles mandaram a mim e a senhora terá que cavalgar comigo até lá. Prometo que chegará sã e salva" - disse o brownie debaixo da enorme capa que o escondia.

 

Sua voz era tão poderosa e cheia de emoção, que a anciã não conseguia negar o seu pedido. Quando estava pronta, saiu de sua casa e, ao ver aquele homem pequeno sob o manto escuro, aproximou-se dele e questionou timidamente:

"O senhor acha que existe alguma chance de nos depararmos com o brownie que vive naquela fazenda?" e continuou "Porque eu não quero correr o risco, já que as pessoas dizem que ele é uma criatura muito feia e muito cruel". 

 

A mulher, obviamente, não havia percebido que estava falando com o próprio brownie, que, após uma enorme gargalhada, respondeu a ela:   

"Mantenha seu coração calmo, minha senhora, pois eu prometo que a mais feia das criaturas que a senhora verá essa noite será o cavaleiro que a levará até a fazenda".

"Oh, então estou tranquila", respondeu a anciã. "Mesmo sem a ver a sua face, tenho certeza que é um homem de verdade. Vamos até lá, salvar a esposa do fazendeiro".

 

Então, subindo no cavalo e agarrando-se ao brownie, a mulher cavalgou durante a noite, mais rápido do que pensava ser possível, passou pelo morro em que vivia a temida criatura e chegou à fazenda.

 

Quando pararam na porta da casa, que estava iluminada, a anciã pode ver os pés e os olhos do seu acompanhante e, imediatamente, perguntou a ele:

 "Que tipo de homem é vc? O que aconteceu com seus pés que são tão grandes e achatados? E por que tem os olhos assim?"

 

Ainda sob o manto, o brownie deu uma imensa gargalhada e disse:

"Não perca tempo conversando comigo. Apresse-se para cuidar da boa senhora que mora nessa fazenda".

 

Com um rápido movimento, tirou a capa, revelou a sua aparência e continuou:

"E quando lhe perguntarem quem foi que foi lhe buscar tão longe para salvar a bondosa mulher que está tão doente, diga a todos que não foi nenhum dos seres humanos que vivem aqui, mas que a senhora cavalgou ao lado do BROWNIE DE O'FERNE-DEN".   

* Esse texto foi retirado do livro Scottish Folk Tales. A história acima foi traduzida por mim, com algumas adaptações do original.  

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